Nação pequena que foi maior do que os deuses em geral o permitem, Portugal precisa dessa espécie de delírio manso, desse sonho acordado que, às vezes, se assemelha ao dos videntes (Voyants no sentido de Rimbaud) e, outras, à pura inconsciência, para estar à altura de si mesmo. Poucos povos serão como o nosso tão intimamente quixotescos, quer dizer, tão indistintamente Quixote e Sancho. Quando se sonharam sonhos maiores do que nós, mesmo a parte de Sancho que nos enraíza na realidade está sempre pronta a tomar os moinhos por gigantes. A nossa última aventura quixotesca tirou-nos a venda dos olhos, e a nossa imagem é hoje mais serena e mais harmoniosa que noutras épocas de desvairo o pôde ser. Mas não nos muda os sonhos.
Eduardo Lourenço
Jornal das Letras, mas tendo como fonte "Portugal - identidade e imagem" in "Nós e a Europa ou as duas razões", por Eduardo Lourenço (1988) Jornal de Letras, Artes e Ideias / 20030904
(www.citador.pt)
Eduardo Lourenço
Jornal das Letras, mas tendo como fonte "Portugal - identidade e imagem" in "Nós e a Europa ou as duas razões", por Eduardo Lourenço (1988) Jornal de Letras, Artes e Ideias / 20030904
(www.citador.pt)