(*)
Descobri aos 13 anos que o que me dava prazer nas
leituras não era a beleza das frases, mas a doença
delas.
Comuniquei ao Padre Ezequiel, um meu Preceptor,
esse gosto esquisito.
Eu pensava que fosse um sujeito escaleno.
- Gostar de fazer defeitos na frase é muito saudável,
o Padre me disse.
Ele fez um limpamento em meus receios.
O Padre falou ainda: Manoel, isso não é doença,
pode muito que você carregue para o resto da vida
um certo gosto por nadas…
E se riu.
Você não é de bugre? – ele continuou.
Que sim, eu respondi.
Veja que bugre só pega por desvios, não anda em
estradas -
Pois é nos desvios que encontra as melhores surpresas
e os ariticuns maduros.
Há que apenas saber errar bem o seu idioma.
Esse Padre Ezequiel foi o meu primeiro professor de
agramática.
Manoel de Barros
VI poema de O Livro das Ignorãças
Notas
Bugre, s.m.: denominação dada a indígenas de diversos grupos do Brasil por serem considerados não cristãos pelos europeus.
Ariticum é um nome indígena que vem do Tupi e significa 'fruta mole'. Nativo dos cerrados brasileiros, sua distribuição é descontínua, aparecendo nos campos abertos, como no cerrado e cerradão onde a vegetação é mais densa. Pode ser encontrado em Goiás, Tocantins, no estado de São Paulo e Mato Grosso do Sul. A árvore do ariticum cresce até 10 metros e possui tronco tortuoso de 20 a 40 cm de diâmetro.
Conhecida popularmente por Pinha, Ariticum, Araticum, Embira, araticum-cagão-macho, cortiça-amarela, araticum-do-morro, araticum-grande, pasmada-do-mato, a Rollinia sylvatica é uma árvore que, quando adulta, atinge o porte de 6,8 m de altura.
(*) Manoel de Barros (1916-2014) “Mundo pequeno, VII” in «O Livro das Ignorãças», 1993. Voz de Manoel de Barros em «Manoel de Barros», Audio-Livro, Ed. Cidade da Luz (Coleção Poesia Falada), São Paulo, 2001 Música: Virgina Astley, “With my eyes wide open I'm dreaming” in «From Gardens Where We Feel Secure», 1983
leituras não era a beleza das frases, mas a doença
delas.
Comuniquei ao Padre Ezequiel, um meu Preceptor,
esse gosto esquisito.
Eu pensava que fosse um sujeito escaleno.
- Gostar de fazer defeitos na frase é muito saudável,
o Padre me disse.
Ele fez um limpamento em meus receios.
O Padre falou ainda: Manoel, isso não é doença,
pode muito que você carregue para o resto da vida
um certo gosto por nadas…
E se riu.
Você não é de bugre? – ele continuou.
Que sim, eu respondi.
Veja que bugre só pega por desvios, não anda em
estradas -
Pois é nos desvios que encontra as melhores surpresas
e os ariticuns maduros.
Há que apenas saber errar bem o seu idioma.
Esse Padre Ezequiel foi o meu primeiro professor de
agramática.
Manoel de Barros
VI poema de O Livro das Ignorãças
Notas
Bugre, s.m.: denominação dada a indígenas de diversos grupos do Brasil por serem considerados não cristãos pelos europeus.
Ariticum é um nome indígena que vem do Tupi e significa 'fruta mole'. Nativo dos cerrados brasileiros, sua distribuição é descontínua, aparecendo nos campos abertos, como no cerrado e cerradão onde a vegetação é mais densa. Pode ser encontrado em Goiás, Tocantins, no estado de São Paulo e Mato Grosso do Sul. A árvore do ariticum cresce até 10 metros e possui tronco tortuoso de 20 a 40 cm de diâmetro.
Conhecida popularmente por Pinha, Ariticum, Araticum, Embira, araticum-cagão-macho, cortiça-amarela, araticum-do-morro, araticum-grande, pasmada-do-mato, a Rollinia sylvatica é uma árvore que, quando adulta, atinge o porte de 6,8 m de altura.
(*) Manoel de Barros (1916-2014) “Mundo pequeno, VII” in «O Livro das Ignorãças», 1993. Voz de Manoel de Barros em «Manoel de Barros», Audio-Livro, Ed. Cidade da Luz (Coleção Poesia Falada), São Paulo, 2001 Música: Virgina Astley, “With my eyes wide open I'm dreaming” in «From Gardens Where We Feel Secure», 1983