sexta-feira, 30 de novembro de 2018

Canção do ano 86 (Fernando Assis Pacheco)

Robert Grant: Ponte de Santa Clara, em Coimbra



Outro Fernando, Fernando Assis Pacheco, morreu no dia 30 de novembro de 1995.


″CANÇÃO DO ANO 86″

Agora quando volto
quando é raro voltar e sempre por um dia
estou à minha espera na ponte de Santa Clara
com um ramo de rosas que levanto
à aproximação do carro
saudando-te caro Fernando Assis Pacheco
filho pródigo destes quintais floridos
quando acontece que volto
que assim volto por pouquíssimo tempo dou comigo
na berma da EN 1 a olhar à esquerda o Vale do Inferno
hoje estragado por um sacana qualquer dum engenheiro
dizendo adeus adeus Fernando Assis Pacheco
menino antigamente sem cuidado

se é que volto intimado pela agenda
do jornal em Condeixa já inquieto espreito
a ver se vens do lado de Pombal
oitavo duma fila atrás do camião
coçando a barba gesto bem teu
com que disfarças o nervoso e a pressa

volto sem querer quando decerto
mais não queria voltar
encasacado anónimo de olho circunvago
Leiria num relance prego no fundo
apetecia parar ao pé de ti Fernando Assis Pacheco
cálido aceno do que morreu
conversamos os dois sobre esse século esses
cafés com quatro mesas e matraquilhos na cave a cheirar a bolor
essas aulas a que faltávamos no último período para empatar cinco
a cinco com os varões todos torcidos

consta que desde então
não fazes mais do que perder

Fernando Assis Pacheco


Aqui podemos ver um vídeo da RTP com este poema.