sexta-feira, 9 de novembro de 2018

A castanha (Ana Luísa Amaral)

Fotografia de Dragoms



A CASTANHA

Rasguei,
como se fosse um pensamento,
uma castanha brava apanhada do chão,
a sua casca acesa e perturbante

A castanha era brava, no sentido
mais breve da palavra,
aguerrida castanha muito jovem,
que lutou contra a força dos meus dedos

Ergui depois, vencido,
o corpo da castanha
usando como berço as minhas mãos

Despido, incandescente,
polimento de cera, cor realmente
nomeando a coisa

Em desvio,
como acontece em tanta natureza,
a zona branca destoando o resto:

uma face de Deus? uma fronteira?
um sobressalto em face do igual?

Hesitante, pousei-a junto às folhas nuas
e ficámos as duas,
como um pensamento,
na nossa dividida
solidão

Ana Luísa Amaral


What's in a Name, Assírio & Alvim, 2017.