Fotografia de Fred Matos
A poesia é feita e desfeita da volúvel matéria das palavras, dos seus murmúrios, dos seus sentidos, dos seus tantas vezes misteriosos propósitos. E das raízes das palavras no mundo onde desgarradamente se prende a solidão no mundo, do formidável poder das palavras não apenas de nomear mas de fazer o mundo.
(...)
Acho que a minha relação com a poesia (com a arte em geral) não é uma busca de qualquer coisa de novo. É uma busca de qualquer coisa que eu já sabia mas que não sabia que sabia. O poema é essa revelação. Nesse aspecto de revelação também tem alguma coisa de mistério e de sagrado.
Manuel António Pina
Manuel António Pina foi-se deste mundo a 19 de outubro de 2012.
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Acho que a minha relação com a poesia (com a arte em geral) não é uma busca de qualquer coisa de novo. É uma busca de qualquer coisa que eu já sabia mas que não sabia que sabia. O poema é essa revelação. Nesse aspecto de revelação também tem alguma coisa de mistério e de sagrado.
Manuel António Pina
A POESIA VAI ACABAR
A poesia vai acabar, os poetas
vão ser colocados em lugares mais úteis.
Por exemplo, observadores de pássaros
(enquanto os pássaros não
acabarem). Esta certeza tive-a hoje ao
entrar numa repartição pública.
Um senhor míope atendia devagar
ao balcão; eu perguntei: – Que fez algum
poeta por este senhor? – E a pergunta
afligiu-me tanto por dentro e por
fora da cabeça que tive que voltar a ler
toda a poesia desde o princípio do mundo.
Uma pergunta numa cabeça.
– Como uma coroa de espinhos:
estão todos a ver onde o autor quer chegar?
A poesia vai acabar, os poetas
vão ser colocados em lugares mais úteis.
Por exemplo, observadores de pássaros
(enquanto os pássaros não
acabarem). Esta certeza tive-a hoje ao
entrar numa repartição pública.
Um senhor míope atendia devagar
ao balcão; eu perguntei: – Que fez algum
poeta por este senhor? – E a pergunta
afligiu-me tanto por dentro e por
fora da cabeça que tive que voltar a ler
toda a poesia desde o princípio do mundo.
Uma pergunta numa cabeça.
– Como uma coroa de espinhos:
estão todos a ver onde o autor quer chegar?
Manuel António Pina foi-se deste mundo a 19 de outubro de 2012.