quinta-feira, 7 de outubro de 2021

Ana Luísa Amaral - Visitações, ou poema que se diz manso

Fotografia de Carølina Motta



VISITAÇÕES, OU POEMA QUE SE DIZ MANSO

De mansinho ela entrou, a minha filha.

A madrugada entrava como ela, mas não
tão de mansinho. Os pés descalços,
de ruído menor que o do meu lápis
e um riso bem maior que o dos meus versos.

Sentou-se no meu colo, de mansinho.

O poema invadia como ela, mas não
tão mansamente, não com esta exigência
tão mansinha. Como um ladrão furtivo,
a minha filha roubou-me a inspiração,
versos quase chegados, quase meus.

E mansamente aqui adormeceu,
feliz pelo seu crime.

Ana Luísa Amaral