quinta-feira, 5 de maio de 2016

Universidades seniores: como vencer a velhice (Armanda Zenhas)



Universidades seniores: como vencer a velhice

O meu amigo José Ambrósio, alentejano de 72 anos, reformado há 22 anos, é aluno de Inglês, Expressão Teatral e História do Património Local na Universidade Sénior de Grândola.


Vive-se a aprender e morre-se sem saber. Troco esta velha sentença pela ideia de que podemos viver mais saudavelmente partilhando saberes, na convicção de que todos podemos saber e ensinar muito, tornando-nos mais autoconfiantes, mais vivos, mais saudáveis e mais felizes nesse processo. Tudo isto fará mais sentido quando se chega a idade da reforma, que muitos temem como o fim da sua vida (pelo menos da ativa). O artigo de hoje é dedicado às universidades seniores, uma das formas de envelhecer de forma ativa e mais saudável e feliz.

No final do século XX, a Organização Mundial de Saúde substituiu o conceito de "envelhecimento saudável" pelo de "envelhecimento ativo", considerando a importância da manutenção da autonomia e da independência dos idosos, tanto ao nível das atividades básicas como das instrumentais da sua vida quotidiana; da valorização das suas competências individuais; do aumento da qualidade de vida e da saúde. A operacionalização deste conceito é de primordial importância numa sociedade em que o aumento da longevidade é um facto. Não irei deter-me sobre as reformas necessárias a nível dos cuidados de saúde e de apoio às famílias, pois não são o objetivo deste espaço. Ficarei pelo aspeto da atividade intelectual, a que as universidades seniores poderão dar uma excelente resposta.

O meu amigo José Ambrósio, alentejano de 72 anos, reformado há 22 anos, é aluno de Inglês, Expressão Teatral e História do Património Local na Universidade Sénior de Grândola. Quando lhe pedi para me falar sobre as vantagens destas universidades, ofereceu-me um texto escrito por si, em que descreve o início da reforma de quem não tem a sorte de ter um envelhecimento ativo. Diz ele que a pessoa reformada, "Nos primeiros tempos, visita os amigos e arruma o que tem em sua casa, passa um tempo no jardim ou agarra-se à televisão, ficando, dia a dia, cada vez mais trôpega e só. A sua alimentação passa a ser descoordenada, não tendo vontade de fazer de comer, levando-a a um estado de doença. Começa a encharcar-se de medicamentos. Estas pessoas, ao sentirem-se sós, por vezes, até podem ir à loucura." Contrapõe, depois, o Sr. Ambrósio, que, se um reformado entrar "numa Universidade ou num projeto de ajuda humanitária, o seu tempo é tomado, em parte, e os seus pensamentos encontram sempre alguma coisa com que se preocupar, deixando de estar sempre a pensar na solidão, porque aí vai encontrar outras pessoas com quem conversar, criando novas amizades e nova maneira de encarar os anos que se avizinham de maneira mais alegre e bem-disposta. Diria eu... vai vencendo a velhice." Acrescenta ainda que, desta forma, não só ganha cada idoso individualmente, mas também o Estado, que poupa nos remédios, nas consultas, nos exames auxiliares de diagnóstico. Remata acrescentando que "todo este sistema de vida obriga a que os alunos elevem o seu ego, o seu amor-próprio e a sua autoestima", incluindo a preocupação com a aparência pessoal e com o vestuário.

De uma forma simples e clara, José Ambrósio concretiza três princípios básicos da Gerontologia Educativa, explicitados por Martín, nomeadamente, evitar declínios prematuros, devidos ao envelhecimento; facultar papéis significativos aos idosos, com vista a uma boa integração no seu contexto social; e desenvolver ou potenciar o crescimento e desenvolvimento pessoal. Trata-se, em resumo, de aumentar a qualidade de vida e o prazer de viver. Como diz ainda Martín, os factos de se estar exposto a ambientes de estimulação e de se utilizar recursos educativos ao longo da vida e na velhice contribuem significativamente para reduzir o declínio intelectual, aumentando os níveis de autonomia pessoal e de pertença social, combatendo a dependência familiar e social e a degradação individual. Enunciando diversas áreas de intervenção educativa com idosos, ele refere os programas de educação e formação básicos, em que se contam as universidades seniores.

Nestas universidades, os idosos podem envolver-se como alunos ou professores, sem diferenças de classes, encontrando um vasto leque de disciplinas, de carácter mais académico ou mais prático, onde a avaliação formal não entra e onde se aprende por gosto e com gosto. Literatura, escrita criativa, teatro, línguas estrangeiras, canto coral, ginástica: a variedade é enorme e depende dos interesses dos idosos e dos recursos disponíveis. Muitas vezes entra-se como aluno e acrescenta-se-lhe o papel de professor de uma determinada disciplina. Do programa faz parte uma componente forte de convívio e de socialização, bem como uma aprendizagem viva, feita de visitas aos locais de estudo (cidades, museus) e de apresentação pública do resultado do trabalho feito (apresentação de peças de teatro, recitais), bem como encontros entre universidades. A alegria e o convívio estão sempre presentes, quebrando-se a monotonia, fazendo-se amizades, aprendendo-se, descobrindo-se interesses e vocações escondidas, rejuvenescendo-se, ganhando-se autoestima, confiança em si próprio e gosto pela vida.

Assim surgiu a RUTIS, Associação Rede de Universidades da Terceira Idade, uma instituição de utilidade pública que representa as universidades seniores portuguesas. As 30 universidades que estiveram na sua origem, em 2005, foram vendo nascer outras, contando-se 107 associadas em setembro de 2008.

Para que o aumento da terceira idade não seja visto como um problema mas como uma riqueza, é preciso investir nas condições e na qualidade de vida dos idosos. As universidades seniores, felizmente em amplo crescimento, são uma parte da resposta, que a sociedade deve acarinhar e apoiar. Contudo, é preciso não esquecer toda a rede de outras estruturas, particularmente no domínio da saúde e do apoio às famílias, em que é urgente investir com seriedade.

Armanda Zenhas


(Fonte: educare.pt, 11-3-2009)

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Universidade Sénior de Grândola

A Universidade Sénior de Grândola entrou em funcionamento no mês de novembro de 2007, é uma resposta social da responsabilidade da Câmara Municipal de Grândola de promoção do envelhecimento ativo, desenvolvida em equipamentos da Autarquia, que visa criar e dinamizar regularmente atividades culturais, educacionais, de lazer e convívio para os/as maiores de 50 anos, com ou sem experiência escolar, num contexto de formação ao longo da vida, em regime informal.